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Os protestos pelo Brasil – breves apontamentos

14 jun

Tudo o que ocorreu na última quinta-feira em Porto Alegre, São Paulo e Rio de Janeiro, têm razões superficiais, razões de fundo e consequências a curto e médio prazo. Mostram o desastre social causado por uma Ditadura mal curada, por uma polícia militarizada e por um Estado afastado do corpo social – e mais, um Estado que o desrespeita. A questão da soberania do representante está diretamente ligada a esse contexto, no seguinte sentido: o direito do povo a opinar sobre seu país não poderia limitar-se a votar, escolher representantes – uma “escolha” duvidosa, já que parte de um sistema eleitoral antidemocrático, no qual são as elites quem escolhem os candidatos e os eleitos têm grande relação com o peso do dinheiro de que dispõem para suas campanhas. Mas na “democracia” capitalista, liberal, é assim. No momento em que “escolhe” seu representante, o povo deposita neste seu direito à soberania, e o vencedor passa a tomar atitudes a seu bel prazer. Chamar isso de democracia é uma agressão à língua.

Na administração desse processo, dirigido pelos patrocinadores eleitorais e por outros interesses político-econômicos que nada têm a ver com os interesses públicos, estão, no Rio Grande do Sul, PDT (e toda a gama de partidos de direita que compõem a Prefeitura) e PT. Em São Paulo, PT e PSDB. No Rio de Janeiro, PMDB. Partidos com trajetórias de centro, direita e esquerda, todos transformados em uma grande coalizão de direita, que ignora os direitos mais básicos, como o direito ao transporte ou à livre manifestação. Se é verdade que, no caso do RS, com Yeda no governo estadual seria pior, também é verdade que com Tarso não está bom. É ele, o governador, o comandante da Polícia Militar (Brigada, no RS). A PM age estimulada pela Prefeitura. As duas instâncias são responsáveis.

No caso de Porto Alegre, a vitória de Fortunati, apoiado pela grande mídia, por quase todos os partidos da direita e por patrocinadores conservadores e poderosos levou a uma guinada autoritária, transformando a cidade em um grande outdoor de jogral empresarial e, em seguida e como consequência, em um pavio pronto para ser aceso.

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Foto: Raphael Tsavkko

Em São Paulo – como já acontecera antes em Porto Alegre – quem terminou de preparar o pavio foi a mídia das elites. Folha de S. Paulo e Estadão pressionaram, apresentaram na quinta-feira editoriais semelhantes aos mais explosivos textos conservadores pré-golpe de 64. Na sexta a Folha voltou atrás e atacou a polícia que antes procurava inflamar, depois de vários de seus repórteres serem agredidos, violentados.

Agredidos e violentados são todos os dias jovens da periferia, e o silêncio é total. Agora uma juventude mais diversa sai às ruas e também é agredida e violada, e o silêncio transforma-se em apoio à polícia, à repressão. Finalmente os agredidos são os próprios funcionários dos grandes jornais, e então, finalmente, há um princípio de indignação, que faz de conta esquecer que, se quem baixou o porrete ou disparou o gatilho foram prefeituras e governos estaduais, quem ergueu o braço do policial e engatilhou a arma foram os próprios donos da mídia. São não apenas cúmplices, mas atores fundamentais da repressão.

Entendo como estrategicamente discutível a opção de alguns manifestantes pelo confronto, mas compreendo suas razões e também a importância, em certos momentos, da violência rebelde como forma de enfrentamento. De uma forma ou de outra, essa violência rebelde é uma realidade. Como também é uma realidade que, mais do que possíveis reduções nas passagens do transporte público, mesmo que acabassem hoje as manifestações deixariam um grande legado. Um legado de conquistas – em Porto Alegre e Goiânia – e, principalmente, de mobilização. O mundo se espanta com o espanto brasileiro frente a protestos, comuns na maioria dos outros países. A passividade brasileira dá um passo para o fim. E, mesmo com esse legado já construído, as manifestações não acabam hoje e não acabarão amanhã.

Segunda-feira vai ser maior.